30.3.11

Balanço arquitetônico - Alberto Xavier

Professor das faculdades Belas Artes e São Judas Tadeu, em São Paulo, é organizador do livro  
Arquitetura moderna no Brasil: depoimentos de uma geração (Cosac Naify, 2003).

1- Enquanto o período moderno que precedeu os anos 1960 registrou obras de repercussão internacional, a ditadura militar instaurada, cerceando o debate em todas as instâncias, debilitou nossa produção arquitetônica por um longo período,  lentamente superado. Dentre os trabalhos importantes que surgiram neste último decênio destaco o Centro de Reabilitação Sarah, no Rio de Janeiro, exemplar que coroa o trabalho extremamente qualificado de João Filgueiras Lima (Lelé), com sua família de escolas e hospitais, criada há 25 anos e ininterruptamente aprimorada. Produção caracterizada pela renovação da técnica, pelo compromisso com a economia, pelo diálogo com a natureza, pela elegância da forma, pelo rigor com as funções, pela riqueza dos espaços, pelo respeito, enfim, às exigências essenciais - físicas e psicológicas - do homem contemporâneo.

2 - Considero esse período uma continuidade do anterior - a última década do século 20. Se, com a redemocratização, nos anos 1980, houve um breve e pouco consequente aceno ao pós-moderno, ocorreu uma reação com a retomada dos princípios básicos da arquitetura moderna brasileira. Contribuíram para a construção
desse quadro algumas gerações de arquitetos. Não só nomes consagrados em décadas anteriores - nascidos nos anos 1930 e 1940, com exceção de Oscar Niemeyer, à frente com seus 103 anos -, como um amplo grupo de jovens discípulos, formados a partir dos anos 1980 e em parte estabelecidos fora do eixo Rio-São Paulo. Não constituem necessariamente um pensamento homogêneo e muitos respondem por obras de pequeno porte, hoje já documentadas em livros e revistas.

3 - Seu significado pode ser medido pelo reconhecimento da crítica estrangeira, após algumas décadas de franca marginalidade. Comprovam- no sua presença em edições de revistas e livros (em particular europeus), a demanda (ainda tímida) de projetos confiados a alguns de nossos principais arquitetos e, especialmente, o Pritzker atribuído a Paulo Mendes da Rocha. O prêmio transcende o reconhecimento do valor de sua obra – tratase do reconhecimento do valor da própria arquitetura brasileira.

4 - Nem avanço, nem retrocesso, e sim continuidade. Seja no que respeita às obras mais significativas – em boa parte responsabilidade dos mesmos arquitetos -, seja quanto à natureza dos programas solicitados. Por outro lado, persistiu a face cruel da degradação urbana, com a ausência de iniciativas públicas compatíveis com a escala de nossas carências, especialmente as relacionadas a saúde, educação, habitação e transporte. Houve, no entanto, nesses campos, experiências que merecem citação, como a continuidade dos projetos hospitalares de Lelé, a produção de edifícios escolares de jovens arquitetos paulistas (em particular os conjuntos dos CEUs) e o
programa carioca Favela-Bairro. Por outro lado, o metrô paulistano prosseguiu a passos lentos, muito aquém da demanda e com estações que ficam a dever às da primeira linha, obra consistente e vigorosa de Marcello Fragelli e equipe, concebida há mais de 40 anos.

5 - Reconheço na produção brasileira um grupo de jovens dotados de talento e criatividade. No entanto, não vejo sentido em identificar “o” representante da década e creio não interessar procurarmos um Oscar Niemeyer entre os jovens. Afinal, a atividade criadora em arquitetura não é produto exclusivo de algumas mentes privilegiadas. É um fenômeno coletivo, resultado da contribuição de uma gama significativa de profissionais. Especialmente nas últimas décadas, com o ingresso cada vez maior de novos arquitetos na corrente produtiva.

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